quarta-feira, 1 de abril de 2009

[] Sloterdijk . [Entrada : moral Sloterdijk]

Estudos sobre Peter Sloterdijk II- Modernidade e mobilização social: critica da razão cinética em Peter Sloterdijk

O filósofo alemão Peter Sloterdijk, fiel ao seu estilo “polêmico” de escrita que prescinde de afirmações politicamente corretas e refuta debates pasteurizados, apaziguadores das consciências ilustradas que fingem debater os rumos do mundo em colóquios intermináveis, escreveu, em 1989, o livro Eurotaoismus: Zur Kritik der politischen Kinetik (ainda sem tradução para o português). A obra, segundo o filósofo alemão, é um compêndio de “exercícios subversivos contra o absolutismo da História e da socialização (Vergesellschaftung)”, deixando entrever assim que Sloterdijk não poupa críticas às teorias da História que a encaram como uma escalada cumulativa de episódios cujo telos é encarnado na palavra progresso.

Num contexto alemão de efervescência política que precedeu a queda do famigerado Muro de Berlim, o autor ousou insurgir-se contra uma das categorias já tornadas clássicas no pensamento filosófico europeu do pós-guerra, e que se alastrou como jargão amplamente utilizado em praticamente todas as ações políticas dos mais diversos matizes, sejam elas partidárias, institucionais, oriundas da sociedade civil ou de iniciativas individuais: o conceito de mobilização.

O que Sloterdijk enseja em seu livro é uma crítica da mobilização planetária tomada como uma revolução permanente que, no seu entender, é falsa. O que há, segundo o autor, é uma “mistificação cinética do mundo” que estabelece como impensável das ações políticas o fator “velocidade”. O que ou quem determina a velocidade de nosso agir cotidiano, de nossas organizações e de nossos modos de gestão do tempo? Porque parece que no processo civilizatório atual as pessoas vêem suas vidas ora como “vítimas” de uma mobilização exterior a elas, e por isso mesmo digna de suspeita, ora como “promotoras” de uma mobilização interior fundamentada na busca de uma essência de si pelas vias místicas (religiosas, por exemplo) ou técnicas (as diversas formas de exploração racional de si através das psicoterapias)? Fazendo eco à indagação de Sloterdijk, é mesmo a cinética o destino de tudo?

Sloterdijk afirma que o projeto da modernidade constitui uma utopia cinética, na qual o total movimento do mundo deve se tornar a realização de nossos projetos para ele. Isso tem a ver com a nossa pretensão de mudar o curso da História com ações racionalmente organizadas, e assim, “fazer história” com o objetivo final de “fazer natureza”. No espírito de um mundo que se auto-intensifica em prol de uma mobilização dos contingentes humanos, descobrir que esta é a nossa natureza primordial, nosso processo primitivo de acumulação e desdobramento concreto de subjetividade. Daí, num processo de simbiose entre verdade e História, Natureza e técnica, passamos a achar que o processo civilizatório é uma “catástrofe natural” e que os sujeitos não têm alternativa a não ser participarem passivamente do processo de sincronização do stress das sociedades modernas, curvando-se ante a “cronolatria” que é característica das mesmas.

Para o filósofo, a cinética se tornou a ética da modernidade. Foi ela que lançou as bases de uma “física da liberdade”, que reduziu a idéia de liberdade à idéia de liberdade de movimentos e de uma “cinética da iniciativa moral”, da qual se depreende que as atitudes dos sujeitos devem forçosamente “mobilizar” e arrebanhar outros sujeitos sob o signo do “esclarecimento” e do “progresso”, este último entendido como um “conceito-movimento” (Bewegungsbegriff) no qual a voz da autoconsciência “ético-cinética” da modernidade “se faz ouvir” e se dissimula. A modernidade é, em suma, ontologicamente puro “ser-para-o-movimento” (Sein-zur-Bewegung), cujos conceitos de “progresso” e “mobilização” são os melhores representantes.

O autor argumenta que “o que existem hoje são atos de mobilização”, seja num contexto dramático de um mundo à beira de uma catástrofe ecológica (e os correspondentes atos de mobilização de uma consciência planetária), de iminência do retorno do messias ( e os atos de mobilização santa das religiões cristãs), de premência das reivindicações por direitos sociais( e todo o cabedal de práticas políticas militantes e mobilizatórias) ou ainda num panorama de indiferença e dessensibilização das pessoas recorrentes nos discursos sobre a “pós-modernidade”( que devem ser combatidas com práticas de “re-encantamento do mundo” e das próprias potencialidades). Em todos os casos, o que há é o pressuposto implícito de que somente o “movimento em direção a mais capacidade de movimento de si e dos outros” é “transformadora” e promotora de uma “evolução histórica”.

Para Sloterdijk, tanto marxistas quanto as “almas cultas” e os burgueses pragmáticos estão lado a lado na “grande coalizão da mobilização” que caracteriza a modernidade. A confusão não é entre discursos, como já apontava o pensador italiano Antonio Negri, mas entre práticas: as práticas mobilizadoras dos movimentos sociais ditos “de esquerda” têm algo do imitatio Christi dos movimentos cristãos e dos movimentos “verdes”. Na aliança entre cinética e técnicas semióticas reside o manancial gerativo das ações de mobilização política dos grupos humanos.

Ora, na perspectiva de uma infinidade de discursos e de práticas que encarnam o impensável político da “mobilização acima de tudo” (Mobilmachungsüberhaupt) cabem as perguntas: quem mobiliza quem e com quais objetivos explícitos e implícitos? Qual o papel efetivo dos “profissionais do socius”, em especial os “profissionais psi” ante as demandas institucionais de mobilização comunitária? Quais técnicas nós utilizamos para este fim, e qual a pertinência deste processo para os atores envolvidos? Existem outras perspectivas para nós que não o da iluminação, da pesquisa e da onipotência? Que projeto está oculto sob a proposição de “conscientização” do povo?

Sloterdijk alerta ainda para o surgimento dos “supersujeitos”( Supersubjekten), que aparecem reiteradamente nestes contextos mobilizatórios e que falam ao mesmo tempo “para mim” e “para nós”. Neste espectro encontramos desde os “políticos profissionais” aos “líderes comunitários”, passando pelos coordenadores de grupos religiosos e profissionais que trabalham em instituições sociais, todos tomados como “containeres emocionais” da vontade coletiva. Que tipo de sujeito está sendo “cultivado” em nossas práticas mobilizadoras?

Criar alternativas que ultrapassem a visão “pedagocatastrófica” dos movimentos sociais, o impulso eleático da empreitada neometafísica que prega a “imobilidade” como caminho para a essência de uma pretensa verdade eterna e o chafurdar depressivo na ladinha pós-moderna da indiferença e que coloquem à luz da critica a mistificação cinética da existência do mundo. É a isso a que nos “mobiliza” esta impressionante obra do filósofo alemão Peter Sloterdijk.

Bibliografia utilizada:
SLOTERDIJK, Peter. Eurotaoismus: Zur Kritik der politischen Kinetik. Suhrkamp Verlag: Frankfurt am Main, 1989.

Leonardo Soares
Publicado no Recanto das Letras em 09/08/2007

Disponível em:

http://recantodasletras.uol.com.br/ensaios/599682

Ver ainda:
  • Estudos sobre Peter Sloterdijk I

“Como assim você não assistiu!?”: Peter Sloterdijk e a produção de escândalos na sociedade da excitação

http://recantodasletras.uol.com.br/ensaios/599677

  • Estudos sobre Peter Sloterdijk III

"A cultura do pânico e a pedagogia da catástrofe"

http://recantodasletras.uol.com.br/ensaios/617302
  • Estudos sobre Peter Sloterdijk IV

"Os frutos da Árvore Mágica"

http://recantodasletras.uol.com.br/resenhasdelivros/702905

  • Estudos sobre Peter Sloterdijk V

"Imperialismo a brasileira?"

http://recantodasletras.uol.com.br/cronicas/834015

sloterdijk, mobilizing the planet

Neste ensaio, a interpretação do presente está baseada em uma cinética filosófica originada por três axiomas. Primeiro , que estamos nos movendo em um mundo que se move ele mesmo; segundo , que os auto-movimentos do mundo incluem nossos próprios auto-movimentos e os afetam; e terceiro , os auto-movimentos do mundo têm como origem nossos auto-movimentos, que são cumulativamente adicionados ao mundo-movimento. A partir destes axiomas, é possível desenvolver mais ou menos inteiramente um relacionamento entre um mundo antigo, um mundo moderno, e um mundo pós-moderno .

http://arredores.posterous.com/tag/cin%C3%A9tica




Le philosophe - Le grand négateur par Peter Sloterdijk

Le grand auteur allemand de « Critique de la raison cynique » et de « Sphères » évoque le génie de « l’Etre et le Néant » par Peter Sloterdijk

(Nouvel Observateur, Semaine du jeudi 3 mars 2005 - n°2104 - Livres)


Il est aujourd’hui courant, dans les milieux de la presse et de l’édition, de mesurer la signification d’un penseur à ce qu’il est parvenu à introduire un mot de son vocabulaire dans le langage courant, ou bien à ce que l’une de ses phrases est devenue proverbiale. On pourrait ainsi déceler la réussite de Hegel dans le fait que n’importe quel concierge d’Allemagne utilise la formule du « en soi et pour soi ». Le succès de Nietzsche tiendrait à ce que son surhomme, devenu un personnage de bande dessinée, hante la culture de masse américanisée. A cette aune, Sartre prend lui aussi sa place dans le cercle élitaire de ceux qui ont acquis les droits d’auteur d’un cliché. Sa devise « on a raison de se révolter » a fait le tour du monde pour devenir finalement un label de marque global de la culture dissidente. Depuis les années 1950, on l’a rencontrée partout où le mythe de la modernité, l’interprétation du sujet comme source de résistance au donné, a marqué la mentalité de ces populations individualistes qui constituent la « société du marché ». L’esprit du temps avait à l’époque passé la chemise de la critique. Il la portait depuis comme une seconde peau.
Ce n’est cependant pas la mode qui décide au bout du compte de la signification d’un penseur, mais la position qu’il occupe dans l’histoire des créations de concepts. Un penseur doit d’abord être devenu inactuel avant que son effet à distance puisse devenir visible. Son texte doit s’être débarrassé de la complicité avec les névroses et les illusions de son époque avant qu’une nouvelle lecture ne dévoile la braise logique qui couve sous les cendres.

La meilleure manière de rendre justice aux résultats obtenus par le penseur est de le situer dans un tableau présentant le déploiement de la négativité dans l’évolution des cultures européennes de la théorie et de la politique. La première phase de ce processus a été ouverte par les ontologies holistes de l’Antiquité. Leur apparition était censée annoncer la naissance de l’empire bimillénaire des métaphysiques de la substance. Parménide et Spinoza l’ont exposé de manière exemplaire : dans cet univers, le destin de la réflexion et de la négativité qui lui est liée, c’est l’inéluctable exigence de se dissoudre en tant que non-étant. Pour la liberté humaine, il en résulte un devoir de s’éteindre en tant que simple reflet trompeur. Si l’homme est libre, c’est seulement pour se soumettre. L’honneur de la substance exige que le« surplus » sauvage, qui se manifeste sous forme d’erreur possible, se noie dans l’objectivité.
Avec l’émergence de la « société » bourgeoise, polytechnique, prométhéenne, l’image change du tout au tout : à partir de la Renaissance s’impose progressivement l’idée que l’essence de la substance est le travail et, plus généralement, la pratique humaine. Le travail, dans cette acception, ne désigne plus la soumission à l’Etant et à sa détresse éternelle, mais la négation concrète des circonstances et du matériau. Depuis que l’homme, comme travailleur, nie consciemment ce qui menace de le nier, la négativité ne peut que se positionner au centre de l’anthropologie. L’homme producteur se transforme potentiellement en pur et simple adversaire de l’Etre et du passé. Il devient le prophète de son propre avenir, un second créateur qui ne supporte plus aucun monde qu’il n’ait lui-même aménagé.

Il pourrait aller de soi que l’intervention de Sartre incarne le point de maturité de la révolte contre la substance : chez lui, la négativité se positive, au-delà de tous les travaux et de tous les combats, pour devenir une antithèse de l’Etre en général ; elle se transforme alors pour passer du rien antique négatif au néant actif de la modernité. La conscience pure, source spontanée et toujours claire de la négativité, est le trou qui se prostitue à tous les objets. En même temps, elle sort intacte de tous les remplissages. L’honneur du sujet est désormais de s’arracher en permanence à tout pouvoir comme à toute nature. Le moindre gramme de matière est une maîtresse obscène qui ne peut que susciter notre révolte. Quand en revanche on veut franchir la ligne, aller vers les substances et se mêler aux choses, on est un déserteur, un traître à la condition humaine. Car bien que l’homme soit condamné à la résistance contre l’Etre, le salaud, ce singe de l’essence, veut que l’Etant le prenne par-derrière.

Sartre était le maître-penseur d’une gnose sadique illuminée par la conviction qu’il n’existe rien entre le ciel et la terre qui ne mérite d’être nié. A la lumière de ce diagnostic, on comprend pourquoi la pensée contemporaine ne peut tout simplement plus progresser sur le chemin de Sartre. On a ouvert un nouveau chapitre dans le roman de la négativité. Sur ses premières pages, on rencontre des concepts sur lesquels le grand professeur de la liberté n’avait pas grand-chose à dire : écosystèmes, réseaux, multitudes, atmosphères, mécanismes cybernétiques. Les termes cardinaux de l’ère postsartrienne sont non pas révolution, mais émergence, non pas refus, mais rattachement et transformation. La science actuelle a rompu avec l’idéologie sartrienne du monde muet et absurde. Nous savons à présent que tout parle et nous pouvons l’entendre dès que nous interrompons le monologue du sujet autiste. La conscience pure a fusionné avec le scintillement tranquille des écrans à cristaux liquides. Les choses et les hommes forment de nouvelles communautés, au-delà de la bourgeoisie et du prolétariat. Il y a longtemps que la société du vécu a ôté à la critique le mot de la bouche. Mieux : la consommation elle-même est devenue la critique et l’anéantissement des choses. La seule à ne pas être encore au chômage, c’est la nausée.

Traduit de l’allemand par Olivier Mannoni

(Agé de 56 ans, Peter Sloterdijk enseigne à l’Ecole des Beaux-Arts de Karlsruhe (Allemagne). Son dernier
ouvrage, « Ecumes. Sphères III », vient de paraître chez Maren Sell Editeurs.)

Semaine du jeudi 3 mars 2005 - n°2104 - Livres

http://www.petersloterdijk.net/french/lire/grandnegateurSatre0305.html


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